Eu tebendigo, Neruda

 


 

Eu te bendigo, Neruda,

Por tua poesia

Sincera e aguda.

 

Te bendigo,

Poeta solidário

Com a vida do povo

Explorado e oprimido,

 

Te bendigo

Por tua poesia

Carregada de denúncia

Salgada de brisa e maresia,

Mas também incendiada

de esperança, de amor e alegria.

 

Te bendigo, sobretudo,

Por tua coragem e rebeldia,

Por tua conduta

De poeta de luta, com ideologia.

 

Te bendigo

Por tua crítica ácida

Aos poetas nefelibatas

Que negligenciam a luta

Pela liberdade e a justiça.

 

Eu te bendigo, Neruda,

Por nos ensinar

Que a poesia não deve

Ser omissa.

 

Te bendigo,

Poeta dos Andes,

Que sobrevoou,

Com asas e olhos de condor,

A América, com suas agruras...

 

E das alturas

Cantou a beleza de sua flora

E de sua fauna

E mais ainda:

Cantou o povo

E sua alma

Em teu Canto General,

Epopeia moderna e universal.

Mitos

 


 

Sísifo e Narciso

carrego pedras

para edificar

diante dos espelhos

meus próprios tombos

 

e não sei se porque quero

ou se porque preciso

 

levo para alto

um deus indeciso

 

nos machucados ombros.

O Amor

 


 

 

 

O amor,

de manhã cedo,

urina restos azedos

de sonhos e afagos.

 

 

Não basta

limpar os dentes

a gosma da língua

que o amor sempre míngua

suas sementes.

 

 

Não adianta

abrir as cortinas

para que entre o cio

de algum argumento

contra o amor morrente;

 

 

A alegria cria mofo

nos olhos de ontem,

mas o amor ascende

de suas próprias cinzas

de suas sobras e minas

úmidas e quentes.

 

 

O amor inclina o homem.

O Sal da Fome

 

 


 

 

O milagre dos pães

é remoto demais

para ser real:

 

sobre a mesa

o silêncio é farto

 

os olhos são fundos

os filhos são muitos

 

(o salário é mínimo!)

 

 

A fome

remove entranhas:

 

uma gota de sal

fere os olhos do pai.